Depois de estudar por cinco anos na China, o empreendedor carioca retornou ao Brasil para montar um promissor negócio de combate à criminalidade
Françoise Terzian
A crise de segurança pública do Brasil é uma das grandes preocupações não só dos governos estaduais. Ela também desafia a startup Gabriel, nascida em 2020 no Rio de Janeiro e hoje sediada em São Paulo, a manter-se em rota ascendente enquanto trabalha, de forma privada e paralela, para ajudar na segurança de condomínios.
Startup de visão computacional — inteligência artificial aplicada ao processamento de imagens —, a Gabriel é uma prestadora de serviço de segurança. Dado seu nicho de atuação e modelo de negócios, que busca o ganho de eficiência, a empresa atraiu o olhar dos fundos de venture capital. Com eles, já captou 80 milhões de reais. A maior parte vem do japonês Softbank, um dos maiores investidores globais em empresas de tecnologia. Mas há também nomes como Canary, LTS Investments e Endeavor.
O interesse no negócio faz sentido. Além de atuar em um segmento com alta demanda, a Gabriel tem apresentado bom desempenho. “Crescemos 4,5 vezes em um ano e 11% mensalmente”, diz Otávio Miranda, cofundador da empresa.
Essa multiplicação dos números é algo que esse carioca parece ter aprendido nos cinco anos em que morou em Pequim, na China. Foi lá que ele se tornou fluente em mandarim e se graduou em Ciência Política pela Renmin University of China. Mas o que levou Miranda a deixar o Rio de Janeiro para desbravar a China?
“Um número chamou minha atenção e me fez estudar a China mais a fundo: entre 2007 e 2011, o país consumiu mais concreto e aço do que os Estados Unidos em todo o século 20”, conta o jovem empreendedor, que viu na megapotência asiática uma poderosa máquina de desenvolvimento. O que Miranda presenciou não foi a outrora China de produtos falsificados, mas um país tecnológico que mudou radicalmente e investiu em inteligência artificial, cidades inteligentes, semicondutores, eletrificação da frota, energia limpa e indústria de ponta. Lá, Miranda se inspirou em um povo com sonhos grandes e audaciosos.
Miranda retornou ao Brasil para fundar a Gabriel ao lado de Erick Coser. Antes de empreender, trabalhou no lançamento da operação brasileira do Kwai — concorrente do TikTok — e atuou no time de expansão internacional da Mobike, onde conheceu seu atual sócio.
Antes de fundar a Gabriel, em 2020, Miranda fez o curso Owners and Presidents Program (OPP), um curso de alta gestão oferecido pelo Insper. “Eu diria que esse curso foi fundamental para mim, pois a Gabriel é a primeira empresa que eu monto”, afirma Miranda. Ele conta que o cofundador e CEO da Gabriel, Erick Coser, tinha bem mais experiência do que ele na época em que criaram a startup. Segundo Miranda, a maturidade para conseguir observar os desafios com as lentes certas, assim como saber como enfrentar as dificuldades que se impõem, teve no Insper um lugar muito importante. “No Insper, aprendi a olhar e filtrar em detalhe para o que realmente importa, tanto para fins de gestão de equipes quanto de ferramentas para observar e trabalhar problemas específicos do nosso negócio.”
O nome Gabriel, não por acaso, foi inspirado no anjo da guarda. Afinal, a missão da empresa é tornar ruas, bairros e cidades mais inteligentes para proteger os cidadãos dentro e fora de casa. As câmeras instaladas em comodato em edifícios residenciais (90% dos clientes) são integradas à Central 24 horas com o intuito de inibir invasões, combater assaltos e servir de segurança para toda a vizinhança.
Hoje, a startup atende 1,4 mil clientes entre Rio de Janeiro e São Paulo. Sua arma é a infraestrutura de câmeras que está construindo. “As cidades carecem — não apenas no Brasil, mas mundo afora — de uma ampla infraestrutura que permita à polícia liberar o efetivo policial existente para atendimento e patrulhamento ativo, e não para um trabalho braçal simples de realização de uma investigação, uma perseguição a um criminoso”, afirma Miranda.
Na ausência de uma ampla infraestrutura que permita ao poder público e à iniciativa privada monitorar tudo o que acontece no espaço público, a Gabriel tomou a iniciativa de ajudar a construir essa infraestrutura. “Cada prédio que instala um par de câmeras apontadas para a rua coloca mais uma peça no quebra-cabeças de como as ruas como um todo podem ser visualizadas. Mais do que isso, como as informações contidas na rua podem ser analisadas. E isso na nossa mecânica de processamento”, diz Miranda.
A Gabriel tem, entre seus objetivos, combinar gestão de alta performance com rápido crescimento. “O caminho da rentabilidade e o do crescimento hiperacelerado precisam ser combinados com gestão de alta performance. É necessário observar e questionar as premissas de modelos de negócio o tempo inteiro e, frequentemente, destruir a maneira como ele está desenhado e começar de novo. Essa é a grande vantagem de uma empresa de tecnologia enxuta: agilidade. Quando orientada a crescer com velocidade, mas prestando atenção a seus fundamentos, é uma máquina difícil de parar.”
Hoje, o desafio da Gabriel, segundo Miranda, não é o de captar novos clientes, e sim distribuir de maneira eficiente seu produto entre Rio de Janeiro e São Paulo. Outro ponto de atenção refere-se à eficiência e ao controle de custos. “Se custo é que nem unha, tem que cortar. Mas é igualmente importante não cortar o dedo fora para a unha parar de crescer”, diz Miranda. “Essa costura é o desafio de toda empresa eficiente, em qualquer segmento.”